LIVRO: A
Pedagogia do Espectador
AUTORA: Flávio
Desgranges
BOLSISTA:
Liliane Pires
REFERENCIA: DESGRANGES,
Flávio. A Pedagogia do
Espectador. São Paulo:
Editora Hucitec: Edições Mandacaru, 2003.
FICHAMENTO
“Trata-se aqui, portanto, de investigar a relação
há muito acalentada entre o teatro e a educação, sem a pretensão de esgotar as
questões levantadas, porém na tentativa de traçar algumas linhas de reflexão
que possibilitem, não só afirmar, mas ampliar o entendimento do teatro como
importante instrumento educacional. Para isso, foram apontadas algumas
reflexões possíveis acerca da relação entre teatro e sociedade, com intuito de
investigar a necessidade de teatro que a vida contemporânea permite supor, e
assinalar a relevância de uma pedagogia do espectador nos dias que correm.” (p.17,
l.20)
“Se os
tearos fossem fechados, não apenas uma porcentagem do público não tomaria
conhecimento disso durantes algumas semanas, como disse Grotowski, referindo-se
ao público europeu, mas que também grande parcela da população brasileira, provavelmente,
nunca se daria conta do ocorrido.” (p.20, l.06)
“Em todos os lugares do mundo, o público de teatro
se tornou rarefeito. Existem aqui e ali tentativas de renovação, mas, em seu
conjunto, o teatro não consegue nem mesmo divertir... Na Broadway, em Paris, em
Londres, a crise é exatamente a mesma.” (p.23, l.13)
“Qualquer iniciativa de formação de espectadores
não pode ser reduzida, como temos visto nos últimos anos no Brasil, a campanhas
de convencimento que, às vezes, escorrem para um tom demagógico do tipo “a
pessoa mais importante do teatro é você” ou investidas esporádicas, que mais
lembram campanha de vacinação, do tipo ”vá ao teatro”, como se dissessem: “vacine-se
contra a ignorância” (...) O prazer advém da experiência, o gosto pela fruição artística
precisa ser estimulado, provocado, vivenciado, o que não se resume a uma
questão de marketing.” (p.28-29, l.29)
“O gosto por
uma cultura artística, contudo, se constrói desde a infância. Aproximar
crianças e adolescentes das atividades teatrais é de fundamental importância,
se quisermos pensar em formar espectadores.” (p.33, l.27)
“É fundamental que a relação do espectador em
formação com o teatro não seja a do aluno que cumpre uma tarefa imposta, mas a
do sujeito que dialoga livremente com a obra, elabora suas interrogações e
formula suas respostas. (...) a ida ao teatro uma atividade que seja, antes de
tudo, prazerosa.” (p.67, l. 30)
“A impossibilidade de uma visão global da cultura
prejudica a formulação de qualquer síntese que se proponha a dar conta do todo
social, pois não há ponto de vista que permita um olhar suficientemente
abrangente, que alcance todos os aspectos da vida humana neste momento
histórico.” (p.144, l.09)
“O teatro
precisava apresentar um mundo passível de transformação e, como o mundo, a obra
teatral poderia ser construída de outras maneiras pelo espectador.” (p.150, l.14)
“Uma das
importantes características da arte moderna foi o estímulo à participação do
receptor, convidando-o a estabelecer uma relação co-autoral com o evento,
especialmente em uma atitude responsiva, de quem formula interpretações para
questões apresentadas pelo autor. A arte contemporânea, por sua vez, pretende
levar ao extremo essa atitude proposta.” (p.159, l.09)
“A característica
talvez mais importante de toda a arte recente, mas que já era fundamental na
arte de vanguarda, é a flexibilidade.” (p.161, l.04)
“O teatro recente, assim, calcado no estímulo à
flexibilidade, provocaria essa capacidade inventiva, ativando uma melhor
performatividade, estimulando a “’imaginação’, que permite ou realizar um novo
lance, ou mudar as regras do jogo. (Lyotard, 1989,p.106)” (p.163, l.05)
“Para se pensar uma pedagogia do espectador
torna-se relevante, entretanto, considerar não apenas a proposta estética que
constitui o espetáculo, mas também os procedimentos extra-espetaculares que
podem fornecer instrumentos preciosos para uma recepção mais apurada.” (p.175,
l.14)
“A educação
artística, no entanto, não pode existir sem a frequentação da arte. (...) Para
a conquista da linguagem teatral é importante que se pense, conjuntamente,
sobre condições de acesso físico do espectador às salas de espetáculo, porque é
na própria experiência artística que o espectador vai descobrir o prazer do ato
que lhe cabe.” (p.176, l.06)
“O sujeito da contemplação
adquire, assim, condições de relacionar múltiplos signos propostos, formulando
novos lances, concebendo jogadas surpreendentes, produzindo conhecimento. E é
dos fios dessa produção que ele poderá tecer a trama de novo futuro.” (p.178,
l.09)
COMENTÁRIO
RELAÇÃO: Espectador Protagonista X Formação do
espectador.
A pesquisa do autor é
extremamente relevante para o que se passa na escola brasileira, seja devido aos
problemas de formação específica dos professores que nelas trabalham com
teatro, seja porque, antes de tudo, as condições institucionais não permitem
experiências desdobradas no tempo escolar e expandidas na vida social dos
jovens. Dada a situação, este livro apresenta uma contribuição inédita para se
pensar e instituir o trabalho de formação de jovens espectadores, que não se
reduz, por exemplo, à montagem de espetáculos. Ao pensar o
espectador como protagonista de um teatro concebido como manifestação cultural
em que a dimensão educativa é intrínseca, este livro toca no núcleo das
mutações contemporâneas da arte - o deslocamento do interesse pelos simbolismos
das obras para o valor simbólico das ações, desligando a arte das categorias
ilusionistas, valorizando a apresentação, com consequente ênfase na
participação do espectador. Sendo assim, a formação de espectadores não se
baseia apenas na formação de plateia, mas na formação artística do indivíduo ao
longo de sua vida (no caso, assistido pela escola), lançando-o assim, a coautoria
criativa da obra exposta à ele.