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domingo, 16 de novembro de 2014

Fichamento Atmosfera e recepção numa experiência com o teatro na Alemanha Bolsista: Ana Caroline de Jesus Santos

Atmosfera e recepção numa experiência com o teatro na Alemanha

Claudio Cajaiba

Tratar de recepção do teatro remete às origens deste fenômeno, localizadas pelas referências históricas na Grécia, especificamente na noção de catarse identificada na obra de Aristóteles. (p.1)
A participação emocional do leitor/espectador depende dessa individualização, desse recorte sensível antropomórfico, desse enraizar de cada palavra num desejo e numa intenção (...). No drama não se vê a linguagem, mas o agente que a produz, de onde vem a dificuldade de encará-lo como texto e o engano de ver no diálogo e nas indicações cênicas uma espécie de ‘notação teatral’ (...). (p.1)

A “metáfora cênica” referida por Mendes – pode-se argumentar – tem sido a maior responsável pelo trânsito dos textos dramáticos pelo mundo. Esse universo metafórico abre precedentes para novas metaforizações, fazendo com que um mesmo drama se transforme em tantos outros, com que atmosferas sejam reconstituídas de modos diferentes, como será discutido adiante. (p.1)

Em sua tese de doutoramento, “A gargalhada de Ulisses”, Mendes escreveu: “A plateia se vinga de certos tipos sociais ou padrões repressivos...” (Mendes, 2001, p. 301). Em 14 de setembro de 2002, no Jornal O Globo, Arnaldo Jabor descreveu suas impressões após assistir ao filme Cidade de Deus, de Fernando Meirelles: “Fui ver o filme e saí modificado. Nós não vemos esse filme; esse filme nos vê”. (p.2)

Jabor parece corroborar o pensamento de Manoel de Barros que, em seu poema Uma didática da invenção, afirmou: “as coisas não querem mais ser vistas por pessoas razoáveis” (Barros, 2001).
Essas três formulações prevêem um lugar para o receptor, que o privilegia. A partir da asserção de Barros, pode-se inferir que entre estas “coisas” está o teatro, que às vezes tem sido vítima de discursos razoáveis, para não dizer viciados. (p.2)

Para que as coisas e o teatro deixem de ser vistas por pessoas razoáveis é preciso que o discurso sobre eles também deixe de ser “razoável”. É preciso que a recepção seja vista como livre das amarras impostas pelo romantismo, que pressupõe o artista genial e o receptor ignaro. (p.2)

Mas não há mais dúvidas de que o espectador adquiriu um novo status, um novo lugar, na teoria que se produz hoje sobre as artes cênicas. As diferentes experiências cênicas que habitam o mundo de hoje exigem essa reflexão. (p.2)

Como advertiu Hans-Thyes Lehmann, “essa é uma questão central” para as artes cênicas, já que nos acostumamos a pensar com conceitos, esquecendo-se que pintar, dançar, representar é também uma forma de pensar. E propõe:
“É isso que devemos evitar, e isso é que fez com que o discurso acadêmico sobre o teatro se tornasse tão monótono, enquanto alguns filósofos desenvolveram uma teoria muito mais genuína, e próxima da arte, do que das pessoas que estavam se ocupando do teatro”
(Lehmann, 2003, p. 18). (p.2)

Nestas situações, identifica-se “o uso vago do termo atmosfera”. Ele lembra que o uso da linguagem cotidiana é, às vezes, até mais precisa do que os discursos especializados. E por isso defende que a expressão atmosfera seja “aplicada ao homem, ao espaço e à natureza” e assim se possa falar
“da atmosfera serena de uma manhã de primavera ou da atmosfera ameaçadora de um céu antes de uma tempestade. Pode-se falar de uma atmosfera lírica de um vale ou da aconchegante atmosfera de um jardim. Ou da atmosfera confortável e envolvente de uma sala, o que se sente logo que se entra nela, mas de cuja atmosfera relaxante também se pode usufruir. Ou mesmo de uma pessoa, sobre a qual se possa dizer, que ela demonstra uma atmosfera impressionante, de um homem ou de uma mulher que nos envolve com sua atmosfera erótica, por exemplo” (idem). (p.3)

Por uma nova estética a partir do conceito de aura

Apesar da denominação “nova estética”, o filósofo contemporâneo lembra que através de Goethe se pode dizer que “a estética faz uma grande diferença, que ela se aproxima de um saber, de uma ciência, e que ela é uma porta através da qual se entra na vida”. (p.4)

Uma nova estética, assim, poderia ser formulada em três modos: (i) “A estética até então predominante é uma estética do juízo, ou seja, uma estética que não trata da experiência, ou da experiência sensitiva, como o termo designava em sua origem grega”. (p.4)

A partir de um determinado momento histórico, a teoria estética passou a integrar também uma função social ao promover a discussão sobre a função das obras de arte. (p.4)

A obra vista como signo que se refere sempre a outro signo, a um determinado significado, pressupõe um sentido pré-determinado, quando, ao contrário, dever-se-ia perceber que uma obra de arte é própria, que ela é portadora de uma realidade própria. Walter Benjamin se refere, com seu conceito de aura, a uma atmosfera de distância e de apreciação, que uma obra original proporciona. “Ele pretendia, com este conceito, fazer uma distinção entre a obra original e sua reprodução, e acreditava num desenvolvimento
próprio da arte que eliminasse essa noção de aura”, o que seria possível com a expansão
da reprodução através dos novos meios de comunicação. (p.4)

De forma similar a vanguarda também adquiriu valor de aura e passou a integrar o rol sagrado da arte. Mas, a despeito destas consequências talvez indesejadas, conseguiram tornar claro que, “aquilo que faz da obra de arte uma obra de arte, o que ela promove, não pode se restringir apenas às propriedades originais desta obra”. (p.5)

“O que é aura? Poder-se-ia defini-la como a única aparição de uma realidade longínqua, por mais próxima que ela possa estar. Em uma tarde de verão, num momento de repouso, se alguém segue no horizonte, com o olhar, uma linha de montanhas, ou um galho cuja sombra protege o seu descanso, ele sente a aura destas montanhas, deste galho. Esta própria evocação permite compreender, sem maiores dificuldades, os fatores sociais que provocaram a decadência da aura” (idem, p. 26-7). (p.5)

(...) “Ela se manifesta na natureza das coisas. O que equivale a dizer que se o observador se entrega ao mundo das coisas, ele compartilha a aura destas coisas. Na verdade a aura é algo manifesto, é uma percepção espacial, algo como um sopro, um vapor – uma atmosfera.” (p.5)

O fato de ter vivido, estudado e trabalhado em Berlim por quase três anos (de 2002 a 2004), de conhecer mais proximamente aquele universo, me permitia certo distanciamento para perceber o deslumbramento dos chineses, japoneses, coreanos, africanos, afegãos, indianos, israelenses e tantas outras nacionalidades ali presentes pela primeira vez.  (p.6)

Contudo, as opções metafóricas para a encenação do drama de Próspero, Miranda e Fernando – como foi discutido pelo grupo de latinos, após a apresentação, sob a atenção da nossa guia em Berlim (que precisava transmitir as impressões em relatório para o Instituto Goethe) – exibiam um primor tecnológico na cenografia, como poucas vezes se vê pelas bandas de cá. Supostamente inspirada na versão cinematográfica de Peter Greenway intitulada Prospero’s Books, a montagem transcorria como se saísse de um livro gigante sobre o palco, em pé, que abria e fechava suas páginas para “descortinar” as distintas situações e os distintos locais onde se passa o drama, com janelas e passagens nas páginas dos livros, numa atmosfera lúdica e atraente. (p.7)

Nas cenas mais simples, como no monólogo inicial e final de Próspero, interpretado pela veterana e talentosa atriz Hildegard Schmahl, as situações que seu exílio na ilha impunham, pareciam mais palpáveis e me envolviam mais como espectador, de fato, na atmosfera do universo dos antigos reis, da vingança, da reconquista do trono, das traições, das conspirações, da magia, do instinto animal dos homens, da gratidão, do servilismo, das revelações de passado obscuro, da rivalidade entre grupos, do romance “impossível” entre jovens, do happy end etc. Contudo, durante o desenrolar da trama, os modernos recursos me remetiam muito mais ao universo pop televisivo, jovial, frenético e por vezes até histérico. (p. 8)

A atmosfera proposta pelo dramaturgo, assimilada de forma contundente pelo encenador, parece se resumir na sugestão que ele faz ao espectador no programa do espetáculo: “Perceba simplesmente que tipo de ação política, emocional ou filosófica a peça exerce sobre você. A peça significa para cada espectador uma coisa diferente”. (p.9)

Se o dramaturgo de A cidade... sugere que a “peça significa para cada espectador uma coisa diferente”, no caso de O oráculo isso se intensifica; não se trata apenas de verificar que os significados são diferentes, mas de que as experiências sinestésicas e sensitivas para cada um também são diferentes. A peça/instalação foi ambientada numa estação de trem abandonada, nas imediações da cidade de Berlim, próxima a uma estação de metrô em funcionamento. (p.10)

Um misto de ficção e realidade, que fazia com que o tempo transcorresse sem que se percebesse. Era grande o sentimento de cumplicidade com aquilo tudo. E assim, cada um saía daquele espaço tendo vivenciado um drama, uma história muito particular, muito genuína... Lembrei-me, então, de outro filósofo alemão, Hans Georg Gadamer, que diz que a experiência com a arte é o lugar mais confortável do homem no mundo, por proporcionar uma clivagem, um desligamento de si, uma entrega ao outro. (p.11)


Comentário:

Primeiro o autor conceitua os termos aura, atmosfera, estética, drama e catarse. Mas especificamente atmosfera e estética. Até chegar no seu objetivo, que foi a sua experiência com um evento teatral alemão, onde assistiu 19 espetáculos em 12 dias.
O autor faz considerações sobre alguns espetáculos apresentados nesse encontro de teatro. No início é relatado que a “metáfora cênica” tem sido a maior responsável pelo transito dos textos dramáticos pelo mundo... esses dramas (um mesmo drama) se transforma em tantos outros, com o que atmosferas sejam reconstituídas de maneiras diferentes.
Em sua obra “A gargalhada de Ulisses”, Cleise Mendes escreveu que “a plateia se vinga de certos tipos sociais ou padrões repressivos...”. Já Arnaldo Jabor assistiu o filme Cidade de Deus, de Fernando Meirelles e relata, “Fui ver o filme e saí modificado.
Nós não vemos esse filme; esse filme nos vê”. Aos olhos do autor (Cajaiba) Jabor parece corroborar com o pensamento de Manoel Bandera, que afirma em seu poema que “as coisas não querem mais ser vistas por pessoas razoáveis”.

Diante desses discursos surgem as perguntas; Quem vê? O que esses espectadores veem? Em que condições estão vendo? Como eles podem aprender com o que estão vendo? A recepção está relacionada a atitude e atividade do espectador (público/observador) diante de determinado espetáculo.

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